30 de abril de 2020

(2) Scary Monsters




Volto aos álbuns da minha vida, agora para vos apresentar o tomo 2. Aqui, a escolha é do álbum que me abriu as portas ao mundo do meu maior herói musical. O disco é Scary Monsters e o seu autor nasceu como David Robert Jones mas ficou para a posteridade como David Bowie.
 
Tinha 13 anos de idade quando Scary Monsters (and Super Creeps), conhecido simplesmente como Scary Monsters, foi editado. Fomos apresentados pelo Luís Filipe Barros, no Rock em Stock, a sua casa de boa memória para onde nos convidava diariamente. Começou por me dar a ouvir o "Ashes to Ashes" e a impressão foi tal que ainda hoje é a minha canção preferida de Bowie. Desde então, permanece por resolver o mistério da identidade do Major Tom, o tal que, vim eu a saber depois, o Ground Control de "Space Oddity" já chamara à base logo depois de o Homem pôr o pé na Lua pela primeira vez. Mas muito mais ficou para além do maravilhamento inicial de "Ashes to Ashes" e do mistério do Major Tom. Ainda hoje sou torturado, para o bem e para o mal, pela frase "I  never done good things, I never done bad things, I never did anything out of the blue". Ainda hoje sinto em mim entranhada a estranheza daquelas vozes japonesas do "It´s No Game", o arrebatamento épico de "Teenage Wildlife" e, no meu quarto de adolescente, espreito em cada visita aos meus pais as pegadas que ficaram da pista de dança solitária em que o "Fashion" o transformou.

Foi por essas alturas que Bowie entrou na minha família. E digo-o em sentido literal: foi então que descobri que nascera no mesmo dia 8 de janeiro da senhora minha mãe (apenas com um ano de diferença), o que fez com que, em todos os dias 8 de janeiro de que me lembro a partir daí, passei a guardar para Bowie - ou para o Major Tom, o Ziggy, o Aladdin Sane, o Thin White Duke ou outra das suas encarnações - o segundo pensamento do dia, assim como o segundo brinde, umas vezes ao almoço outras ao jantar, depois dos que eram destinados à senhora minha mãe. Bowie, como um zeloso irmão mais velho, esteve sempre presente nos anos que se seguiram: foi ao som de "Let´s Dance", de "China Girl" e de "Modern Love" que as minhas saídas noturnas se iniciaram (no Roller Magic, ao Parque Mayer, onde de patins calçados e mão estendida comecei belas amizades com juvenis apreciadoras de Bowie), quase que vou jurar que o Thin White Duke cantarolava ao longe o "Young Americans" quando se deu o primeiro beijo e que ecoava o "Heroes" quando me vieram os primeiros ímpetos de independência, isto depois de "Space Oddity", "The Man Who Sold the World", "Starman", "Life on Mars?" e "Ziggy Stardust" terem reforçado a inabalável certeza de que a minha vocação era a astronomia, como garantira em casa, teria pouco mais de 10 anos, depois de ter visto "2001, Odisseia no Espaço" e "Encontros Imediatos do Terceiro Grau". Pela vida fora continuou a acompanhar-me, não me abandonando nem mesmo na sua morte terrena. Aí, nesse último suspiro da sua existência mundana, ofereceu-nos "Blackstar", o mais belo testamento de sempre. E, na maior catarse coletiva de que me lembro antes do golo de Eder fazer explodir o país inteiro de desenfreada alegria, a sua vida para além da morte foi celebrada numa matiné de domingo no Lux que ficou para a história (quem lá esteve como eu sabe bem da emoção que tomou conta de Santa Apolónia e arredores).
 

Mal me ficaria se, desde o percurso iniciado com Scary Monsters, não prestasse a Bowie a minha privadíssima homenagem. Aconteceu na noite de 20 para 21 de Maio de 2017 quando dobrei o meio século: Bowie, o meu herói de todos os tempos, desceu à Terra e tomou conta do meu corpo, numa forma a meio caminho entre o Ziggy Stardust e o Aladdin Sane. De olhos bem abertos, um azul, outro para o esverdeado, com vestes psicadélicas a combinar com uma cabeleira ruiva e um raio estampado na cara. Nem em sonhos, em todo o futuro que os meus 13 anos traziam consigo enquanto ouvia o Scary Monsters, teria imaginado que, trinta e sete anos depois, me vestiria de Bowie para celebrar as nossas vidas cruzadas. A minha bem mais mortal do que a dele, por sinal.

Passo agora a bola para a Teresa Conceição e o Guilherme Godinho virem aqui contar-nos coisas sobre o álbum, ou álbuns, das suas vidas.

2 comentários:

  1. Diogo, como és um cavalheiro, já me tinha convidado em privado para esta aventura!
    Lá irei com gosto, mas nao à velocidade gostaria por causa destes prostitutos tempos que nos placam! Além disso, ontem troquei-te pelo streaming da Torre Bela!
    Mas, até já sei qual é disco, agora os discos.. estou na atitude prudencial de fazer a lista.
    Nota: o Black Star é uma coisa - literalmente - do além, mas também já o The Next Day era bom que se farta!

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    1. Guilherme, avança. Sem medos. Estão milhares de pessoas à porta do Escrever é Triste a suplicar pela tua lista.

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