5 de abril de 2020

Manhã de domingo na plateia - Fila C

Cinema Tortoise - Art Library Fundação Calouste Gulbenkian

Vivo num bairro de Lisboa que se misturou com o tempo, Campolide.
Alguns pátios com velhinhos que ainda se lembram quando a Leandro Braga tinha o Cine – Tortoise que depois foi Cinema Campolide no nº15 e casais novos com tatuagens, raparigas com cabelos coloridos, artistas e skaters que descem a General Taborda a deixar pelo caminho o cheiro da erva que fumam até chegar à Praça de Espanha.
Gosto deste bairro porque aqui tudo se mistura, para “eles” nós os jovens não somos estranhos, somos talvez as novas conversas que têm em longas manhãs no café dos "Amigos de Campolide" enquanto o Sr. Manel lentamente serve as suas meias de leite mornas e torradas em pão de cereais.

Aqui toda a gente sabe (ou pensa que sabe) da vida uns dos outros.

Hoje é domingo. Não há café aberto, algumas devem ir à Missa, outras ao Pingo Doce e outros vão comprar o jornal.
Hoje é um domingo COVID-19, não há Missa para ninguém, o Pingo Doce é à vez e o jornal já está fechado faz 15 dias.

Enquanto tomo o pequeno- almoço junto à janela vejo e ouço dois casais a conversarem.
Um deles na sua janela do terceiro andar e o outro lá em baixo na rua com o cão pela trela.
Contam que agora só vão à frutaria da D. Isabel porque vende produtos portugueses, que iam de férias para a Argentina mas já não vão porque não sabem se vão haver férias, a haver vão para um sitio qualquer em Portugal, não interessa onde. Tem é que ser em Portugal!
Ontem foram a uma festa com 40 pessoas e foi uma loucura, a temática era “TROPICAL”, todos de bikini a beberem caipirinhas numa app qualquer dessas que junta pessoas. Hoje têm outra!
A amiga da rapariga que está na rua “a Marina se calhar está infectada”. Na terça-feira tinha sintomas e ligou para o SNS24, quarta-feira foi fazer o teste. Hoje ainda não sabe o resultado. Acham que o número de infectados não é o que dizem nas notícias. Lá de cima respondem: “Claro que não é!”. Discutem uns bons 5 minutos sobre isso e chegam a conclusão que não interessa nada.
Fico a saber que o canteiro de oregãos do casal do terceiro andar está de saúde e os caracóis começam a aparecer. Combinam “quando ISTO passar” fazer um almoço de caracóis no terraço dos amigos.
Os vizinhos estão a ver a “Casa de Papel” alternando com o “Peaky Blinders” que tem uma boa fotografia.
O cão ladra e o casal que está na rua despede-se com : “Bem vamos andando que está a ficar frio, venham logo à festa!”.
A janela do terceiro andar fecha e o casal segue rua acima com o cão pela trela.

Afinal ainda há cinema em Campolide na Rua Leandro Braga.

Bilhete Cinema Campolide - Carlos Caria

9 comentários:

  1. E por 8 escudos apenas! Ó tempo! Volta para a frente, as saudades do futuro pesam como uma bigorna!

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  2. Marta, não fazia ideia que tinha existido um cinema em Campolide. Será que isso faz de mim um jovem? Quando fechou?

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    1. Diogo pela informação que encontrei o Cinema abriu portas em 1925, passou por várias "mãos" e encerra, infelizmente, em 1977.

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  3. Ola vizinha!! Posso partilhar no Grupo de Campolide? Obrigada :)

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